O encontro marcado: da frustração à vitória (parte 2)

Segunda e última parte do depoimento do professor Francisco Leite sobre sua trajetória nos concursos públicos a partir da década de 70.

De preferência, leia esta postagem quando já tiver lido a primeira parte aqui.

Começo esta segunda parte da minha história do encontro marcado, relatando o que vivi, na década de 80 (mais precisamente, no natal de 1982), quando recebi a notícia de que fui aprovado no vestibular para o Curso de Direito na Universidade Federal da Paraíba - Campus VI- Sousa. Minha alegria foi contida, uma vez que a UFPB não oferecia curso noturno. Como eu ia me virar, já que durante o dia vivia muito ocupado em vender remédios, aplicar injeções, fazer curativos em missão necessária para somar meu oitavo de salário mínimo aos míseros rendimentos da minha irmã, empregada em uma fábrica de roupas, como costureira?

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Que fazer, então? Havia uma força inabalável que não me permitia parar de estudar. Esta força me trouxe a sorte. Matriculei-me no curso de Direito, à tarde, e contava os segundos de desespero por não saber como iria conciliar trabalho e estudo. Eis que um dia, por volta das 15 horas, um telefonema divino mudou aquela minha vida. Era uma professora de Direito Penal, chamada Lourdinha Rodrigues, que também foi minha ex-professora de História no segundo grau. Ela estava me convidando para ser estagiário na Caixa pelo sistema do Crédito Educativo, em jornada no turno matutino e, o melhor, com direito a um salário mínimo e meio! Era do que eu precisava para cursar minha graduação!

Devo muito a esta professora, posto que, muito tímido, nunca tive muita proximidade com ela. Ademais, um estágio na Caixa, naquela época, e em Sousa, era disputado aos tapas pelas pessoas influentes da cidade. E pró Lourdinha, sem saber dos meus dilemas e peripécias interiores, talvez apenas impressionada com minhas notas em sua matéria, lembrou-se de mim. Obrigado, professora Lourdinha, acho que sua ajuda me permitiu começar a ensaiar uma possível virada no jogo: já não estava mais 5 x 0, mas 5 x 1!

Dediquei-me de corpo e alma àquele estágio. Claro que, para início de conversa, tive que me tornar “craque” em datilografia. Conheci todos os procedimentos que eram permitidos a um estagiário da Caixa e, empolgado, escrevi ao setor de pessoal contando tudo o que passei naquele concurso precedente. Nada de obter resposta.

Acontece que estágio é estágio, isto é, é por tempo determinado, portanto, um dia, ele acabaria, eu teria que “correr atrás”. A partir dali, mais antenado com o mundo, já universitário, consegui um emprego de professor de matemática em um colégio privado. Pela manhã, Caixa; à tarde, Universidade; e, à noite, aulas no colégio, de propriedade do inesquecível professor Macedo.

Nesse mesmo tempo, eu já com 21 anos, me inscrevi para dois concursos federais, ambos realizados pelo antigo DASP: o de Investigador Datiloscópico (uma vaga para João Pessoa) e o de Agente Administrativo do antigo INPS (vagas para algumas cidades da Paraíba, inclusive Sousa). Marquei mais um tento, pois a única vaga para Identificador Datiloscópico foi minha. 5 a 2 passou a ser o placar!

Porém, para minha infelicidade, o concurso foi anulado, por ter havido fraude na cidade de Santos. Concluindo: 6 x 2. Marcada nova data de prova, estava com raiva e medo intensos. Raiva, medo e necessidade/carência são ingredientes poderosíssimos, tanto para o bem quanto para o mal. Marquei mais um gol, placar de 6 x 3. Ganhei novamente a única vaga e guardo o documento da divulgação do resultado como se fosse um troféu até hoje!

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No mesmo ano fui aprovado em terceiro lugar no concurso do INPS. O estágio na Caixa chegou ao fim e apesar de aprovado em dois concursos, ainda não tinha sido chamado. Para onde eu voltei? Para a mesma farmácia, com a minha humildade de sempre (se quer prosseguir nessa batalha, é preciso manter a humildade). Mas nessa época o bom senso já tinha se estabelecido na UFPB e já se podia cursar Direito à noite. O prejuízo foi o emprego de professor e o salário que voltou ao patamar de antes. De qualquer maneira, mesmo com o placar desfavorável, eu me considerava grande vitorioso, posto que aprovado em dois concursos e esperando nomeação (ela ocorreu três meses depois, e para os dois na mesma semana!). Em 1984 tinha me tornado funcionário público federal, sem indicações, sem padrinhos. Eu, o menino do sítio Saco Sinhazinha, então com 23 anos!

O primeiro salário – tanto dinheiro – comemorei-o sentado em uma mesinha de bar (calçadinha da Sorvelanche), quando tive a oportunidade de experimentar a primeira cerveja da minha vida. No outro dia, comprei não sei quantos livros, todos aqueles desejados ao longo da minha vida de estudante. Fiquei no INPS apenas dois anos e meio. Colei grau no curso de Direito em 1987 e dias depois assumi o cargo de Técnico do Tesouro Nacional, por aprovação em concurso organizado pela ESAF, no polo de Juazeiro do Norte - CE.

Em 1989, quase passei para Auditor-Fiscal do Tesouro Nacional. No concurso de 1991, fui aprovado para Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, tendo ficado na 116ª posição, dentre as 500 oferecidas em âmbito nacional.

Quanto à vida acadêmica, foi mantida, principalmente atuando no Centro Universitário de João Pessoa, onde leciono há 19 anos. Fruto dessa vida é o livro "Direito Tributário Aplicado", esgotado em menos de um ano. E para dizer que o pulso ainda pulsa, há um ano fui nomeado professor da Universidade Estadual da Paraíba, claro que por concurso público. Como estava o placar mesmo? Já nem me importa mais!

O fato é que ainda se mantém vivo em mim o espírito de uma frase que sempre colocava nos meus cadernos, na longínqua idade de 12 anos: “Hei de vencer!”

E esta história ofereço a todos os concurseiros que sabem que a vida não é um ponto final, mas são reticências...

Contribuição do Professor Francisco Leite. Edição: Alberto Vicente

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