Dicas sobre crase para provas de concursos
O fenômeno da crase ainda consegue tirar o sono de muitos concurseiros. Confira algumas dicas sobre o tema e acompanhe alguns exemplos extraídos de provas e situações cotidianas.
Crase é uma assunto que certamente faz parte da vida de muitos concurseiros, ao ponto de muitos o incluírem no rol das populares "pegadinhas" da língua portuguesa escrita (já que na fala a presença ou ausência de crase é imperceptível, salvo para ouvidos treinados ou gente que tem muito boa dicção!).
Para ilustrar um pouco este artigo, elencaremos alguns exemplos, mas não faremos juízo de valor algum sobre os autores das frases que se seguem, pois quem sabe o dia de amanhã? Meu interesse será apenas comentar algumas poucas ocorrências linguísticas envolvendo a utilização do acento indicativo de crase. Comentarei, obviamente, à luz de alguma teoria gramatical normativa, uma vez que, no final das contas, gramática normativa é aquela parte da lingüística que acaba sendo o que há de mais destacável no idioma, principalmente em nossas relações sociais e na mídia.
- - APOSTILA IBGE 2017: AGENTE CENSITÁRIO MUNICIPAL (ACM) e AGENTE CENSITÁRIO SUPERVISOR (ACS)
- - APOSTILA IBGE 2017: RECENSEADOR
Alguém me perguntou outro dia se na frase "TV à cabo", o acento grave de fato existe. Em alguns textos jornalísticos online já li - não uma ou duas vezes - expressões do tipo "de segunda à sexta" ou mesmo "às inscrições podem ser feitas no site xxx". Por fim, certa feita, em uma aula sobre microorganismos, li em uns dos slides as construções: "aumento da resistência bacteriana à antibióticos" e "flucloxacilina é mais resistente à beta-lactamase". Qual dessas expressões utilizou adequadamente a crase?
Antes de tudo, é preciso dizer que artigo algum é capaz de encerrar o assunto "crase" e também estou fora do discurso do certo/errado do gramatiquês, mas infelizmente algumas de nossas convenções sociais carecem desse discurso, a exemplo das provas objetivas de língua portuguesa. Então, o jeito é o concurseiro ir aos poucos afixando seus conhecimentos a respeito do tema, consultando os gramáticos, resolvendo várias provas, lendo muito qualquer tipo de texto e treinando a escrita também. Disse tudo isso para dizer exatamente o que alguns não gostariam de ouvir: "não esperemos fórmulas prontas!"
O que é crase
Devemos lembrar que a crase é "a fusão de dois ou mais sons iguais num só" (Bechara, 2009). Assim, o "a" (artigo) somado ao "a" (preposição) vai gerar o "à", ou, como muitos dizem, o "a craseado". E para quem pensa que dizer "a craseado" é um erro, vale à pena citar litaralmente o que Evanildo Bechara diz a respeito:
"Não há razão para condenar-se o verbo crasear para significar “pôr o acento grave indicativo da crase”. O que se não deve é chamar crase ao acento grave".
Mais claro do que isto, impossível.
O acento grave
O acento grave (aquele em forma de acento agudo invertido para a esquerda) é característico da ocorrência dessa fusão. O emprego mais popular desse acento, sem dúvidas, é quando temos a intenção de sinalizar no texto que ocorreu uma contração da preposição "a" (que pode ser equivalente a "para") com o artigo feminino "a" ou pronomes demonstrativos. Exemplos clássicos: "Vou à Bahia" (leia-se "Vou para a Bahia") e "Estou voltando àquela velha cidade". Outros usos possíveis do acento indicativo de crase podem ser conferidos em todas as gramáticas do português.
O emprego do "à" acentuado, segundo o mesmo autor, é freqüente quando construímos locuções em que queremos assinalar, por motivo de clareza, "a pura preposição a que rege um substantivo feminino singular", a exemplo de "à força, à míngua, à bala, à faca, etc: "Fulano assassinou à bala a companheira".
- Apostila - SARGENTO DE TRÁFEGO AÉREO - Concurso FAB 2017
- Apostila - CF de SARGENTOS DA AERONÁUTICA - Concurso FAB (preparatória)
Alguns usos do acento grave no dia a dia
Voltando aos exemplos iniciais e considerando o que já foi dito, podemos dizer que a preposição presente na expressão "TV a cabo", de fato, não necessita do acento grave indicativo de crase, pelo menos obrigatoriamente, já que ela não está regendo um substantivo feminino (cabo é masculino). A não ser que considerássemos que a TV funcionasse "à moda" de um cabo, o que a meu ver não é o caso, já que o cabo em questão está mais servindo para diferenciar um serviço que envolve canais pagos (equivale a dizer "TV paga" ou TV "por assinatura").
Da mesma forma, em "aumento da resistência bacteriana à antibióticos", o recomendável é o uso do "a" sem o acento grave. ("aumento da resistência bacteriana a antibióticos"). Diferentemente da frase "flucloxacilina é mais resistente à beta-lactamase", pois a adequação do acento grave ocorre pelo fato de "betalactamase" ser um substantivo feminino" e também pela própria "natureza" do verbo resistir, nesses casos (quem/o que resiste, resiste a alguém/alguma coisa).
No caso da expressão "de segunda à sexta" não vejo adequação possível para o sinal indicativo de crase. A não ser por exemplo, que eu dissesse "ficamos juntos da segunda à sexta-feira santa", pois aqui estaria "definindo" com um artigo (a, usdo em de+a), qual a segunda e qual a sexta às quais estou me referindo, especificamente. No caso de "às inscrições podem ser feitas no site xxx", está claramente evidenciado que um artigo feminino no plural puro e simples - ou seja, apenas "as", sem acento grave) - se encaixaria muito melhor.
Exemplos de provas de concursos
Apesar de não pretender levar em conta o texto integral das provas dos concursos, trago à tona aqui, apenas como ilustração, alguns exemplos de questões sobre crase. Primeiramente, lembro que em uma das provas do Concurso Caixa 2010, havia uma questão sobre crase, cuja resposta correta estava baseada no seguinte trecho:
"O despreparo dos jovens, portanto, é patente. "Desde cedo, é preciso ensinar as crianças a pensar e a se adequar a novas realidades", diz Ramos. "Elas contam, inclusive, com uma vantagem para isso: são mais flexíveis a mudanças e estão sempre abertas a novas tecnologias". Infelizmente, conclui o especialista, não é isso o que acontece nas escolas".
A resposta dizia que
"Em 'abertas a novas tecnologias', se o termo 'a' fosse flexionado no plural, o emprego do sinal indicativo de crase seria obrigatório.
Considerando o emprego da preposição "a" no contexto como sendo equivalente a "para" e levando em conta que se fôssemos transpor a frase a partir de "para", teríamos como resultado "abertas para as novas tecnologias", podemos mesmo dizer que, ao pluralizarmos o "a" estaríamos automaticamente admitindo que a contração de "a"(preposição) + "as" (artigo feminino plural) de fato ocorreu na frase. Ou seja, a frase "às novas tecnologias" teria que ser obrigatoriamente escolhida.
Numa prova dos Correios 2011 para Operador de triagem, uma questão continha o seguinte trecho:
O transcorrer da história postal corresponde à crescente transformação histórica do próprio país, razão pela qual conhecer os principais fatos ligados à implementação e ao aperfeiçoamento dos serviços postais fornece um panorama do desenvolvimento histórico brasileiro.
E perguntava:
Emprega-se o sinal indicativo de crase em "corresponde à crescente transformação histórica" (R.1-2) porque
A - a expressão "história postal" exige complemento antecedido por artigo definido feminino.
B - a forma verbal "corresponde" exige complemento regido da preposição a, e a expressão que a complementa é precedida do artigo definido a.
C - a expressão "transformação histórica" deve ser imediatamente precedida da preposição a.
D - a forma verbal "transcorrer" exige complemento regido da preposição a.
E - a forma verbal "transcorrer" foi transformada em substantivo pela anteposição do artigo "O".
A letra A, obviamente, não pode ser a correta, porque "história postal" não pode determinar o uso subseqüente do "a" acentuado, ou seja, a expressão não está 'exigindo' ocorrência de crase a posteriori.
A letra C é incorreta porque "transformação histórica" poderia muito bem ser precedida apenas pelo artigo feminino definido, sem necessariamente a preposição, já que a expressão em si não está determina a regência da preposição, nesse caso.
A letra D está errada, pois "transcorrer" no texto não está sendo exatamente utilizado como um verbo, mas sim como um substantivo, inclusive o artigo masculino que o antecede deixa isso bem claro ("o transcorrer" é equivalente à frase "a evolução").
A letra E também está errada não pelo que diz (que está correto) mas pelo que o enunciado da questão diz. A questão está perguntando sobre o emprego do sinal indicativo de crase e não sobre o emprego de verbo como substantivo.
Então, sobra a letra B, que é a correta.
É isso, até uma próxima e boas provas.
Confira mais dicas de Português: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9
Alberto VicenteCompartilhe
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