Cotas para ingresso na carreira pública: avanço ou retrocesso?
Se a Lei de cotas para acesso às universidades, que já foi regulamentada, continua gerando discussões acaloradas, imagine o que se dirá sobre lei de cotas para concursos públicos?
Um dos nossos leitores questionou recentemente o fato de existir, na ficha de inscrição para o concurso do Banco do Brasil, a pergunta sobre qual a cor da pele do candidato. Para o leitor, este tipo de pergunta tem a intenção de separar as vagas para negros, índios e pardos no funcionalismo público (as cotas). A Lei de Cotas para negros, pardos ou indígenas está em discussão há um bom tempo no Brasil, tendo sido já aprovada, por exemplo, em municípios como Salvador (afrodescendentes) e no Rio de Janeiro (índios e negros). No Estado do Rio Grande do Sul a Lei já foi aprovada no legislativo e aguarda sanção do governador.
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Assim como a Lei de Cotas nas universidades públicas, que já uma realidade, a Lei de Cotas em concursos públicos continua gerando polêmicas. Para alguns, se esta medida for à frente, significará um retrocesso para a administração pública admitir em seus órgãos profissionais por causa da raça e não da competência. Para outros, como o senador Paulo Paim, é graças às cotas para universidades que há mais de um milhão de estudantes frequentando o ensino superior no Brasil. A ministra da Secretaria Especial de Políticas Públicas da Igualdade Racial, Luiza Bairros, também encara de maneira bastante positiva uma lei desse tipo, ao lembrar que, embora se veja tanto desenvolvimento no país, este ainda não foi suficiente para fazer com que os diferenciais entre negros e brancos no país desaparecessem ou, ao menos, fossem minoradas.
Reinaldo Azevedo, colunista da "Veja", opinou recentemente que, criando mais esta condição de acesso ao funcionalismo, o Estado se comporta como uma babá de cotistas, impondo uma condição que torna o processo de seleção injusto e que não seleciona os seus futuros funcionários pela competência intelectual e física, mas apenas pela cor da pele. O especialista ainda diz que, após a Lei de Cotas tornar-se um fato em unidades públicas de ensino superior, parece que a "moda" quer se alastrar pelos concursos públicos como se isso fosse uma espécie de restituição para os negros, opinando que as condições de estudo e de igualdade são as grandes motivadoras tanto para negros e brancos adentrarem o ensino superior quanto para o funcionário público.
Negra, 35 anos, estudante de administração, Bárbara Cristina Souza fala que esta possível Lei de Cotas para concursos públicos parece nos levar a entender que serão aplicadas provas diferenciadas para um grupo de negros - considerados intelectualmente inferiores - e que cabe a este grupo brigar entre si por uma vaga, enquanto os brancos e amarelos, que integram outro grupo, farão outro tipo de avaliação. "Não vejo sentido nisso. Acho que está mais do que na hora de colocar fim nestes modos modernos de segregação e se batalhar por um ensino de qualidade para todos".
Branca, 35 anos, estudante de enfermagem e concurseira, Dilma Oliveira concorda que os negros de baixa renda são desprovidos de oportunidades, um obstáculo que dificulta o acesso a boas formações acadêmicas e chances de emprego. Mas concorda que a democracia deve cumprir sua premissa de governar para os menos favorecidos, começando por uma educação de qualidade, que alcance a todos, independente de raça. "Com boa educação, os negros, amarelos, índios e pardos poderão competir em concursos públicos de igual para igual".
Atualização (13/02/2014): Se o ensino básico brasileiro fosse de qualidade, não precisaríamos de cotas em concursos
No começo de fevereiro de 2014, a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, afirmou que a política de cotas para negros em concursos públicos, tão debatida hoje, não seria necessária se o país tivesse um ensino básico de qualidade. Ela explicou que a proposta de cotas no serviço público, se aprovada, terá uma vigência de dez anos, justamente para observar se as deficiências na educação pública estarão corrigidas ao fim do período.
“Existe ainda, com toda melhoria que já ocorreu, um grande espaço para o aprimoramento da educação no Brasil. É exatamente por isso que o projeto de lei prevê um período de dez anos de funcionamento. Esperamos que esse período seja suficiente para que governos estaduais e municipais se juntem ao governo federal no esforço de melhoria da qualidade da educação”.
Bairros reconheceu a existência de uma parcela de brasileiros pobres e brancos que, portanto, não têm acesso ao sistema de cotas. Mas, segundo ela, a população branca, mesmo sendo de baixa renda, sempre tem mais oportunidades ao longo da vida do que as pessoas negras, o que corroboraria ainda mais com a proposta.
“Historicamente, as pessoas brancas quando são pobres, são sempre expostas a oportunidades que são totalmente diferenciadas daquelas colocadas para as pessoas negras. Portanto, uma pessoa branca, mesmo pobre, opera na sociedade com um valor simbólico da sua cor de pele, o que com os negros não acontece em momento nenhum porque o racismo não permite”, disse a ministra.
Luiza participou do lançamento de uma nota técnica produzida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) hoje na Câmara dos Deputados. O documento do instituto visa a embasar o Projeto de Lei 6.738/2013 que reserva cotas para negros em concursos públicos. Um dos dados apresenta a relação de brancos e negros em determinados cargos públicos. As funções de diplomata e auditor da Receita Federal têm 94% e 87,7%, respectivamente, de funcionários de cor branca.
O estudo também mostra que 51,5% de ocupantes de cargos públicos são brancos e 47,4 são negros. Para a ministra da Seppir, porém, o aparente equilíbrio não demonstra igualdade de condições no serviço público. Segundo ela, não há uma distribuição equânime entre os cargos e os brancos ocupariam mais vagas de chefia enquanto negros seriam funcionários em posições mais subalternas. Colaboração da Agência Brasil (Marcelo Brandão e Fábio Massalli)
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