Consciência Negra: o que é e como surgiu?

Saiba mais sobre o Dia da Consciência Negra e entenda do que se trata a data, história e representação simbólica para o Brasil.

O Dia da Consciência Negra foi instaurado como uma ferramenta social e de reparação histórica para não deixar cair no esquecimento ou na banalização a formação do povo brasileiro através da integração de pessoas de origens africanas.

A data foi pensada também para servir como reflexão sobre a história do Brasil enquanto país escravocrata, construído e sustentado à base de mais de 300 anos de escravidão de povos africanos que, trazidos contra a vontade para o país, eram vendidos como propriedades e tinham sua força de trabalho explorada continuamente, com níveis brutais de violência e tortura.

Como surgiu o Dia da Consciência Negra?

Trazidos ao Brasil sem direito a nada, os povos de ascendência africana foram obrigados a deixarem seus países de origem e a própria história, ficando isolados de suas culturas e também da relação com seus antepassados.

O Dia da Consciência Negra, pensado para que a história não seja esquecida, é uma vitória do Movimento Negro, subssequente ao movimento abolicionista no Brasil e que se destacou ainda mais durante o período da Ditadura Militar, no final dos anos de 1970.

Naquele período, predominava o trabalho do Movimento Negro Unificado contra o Racismo (MNU) que, durante um congresso em São Paulo, definiu a figura de Zumbi dos Palmares como representante da resistência dos negros contra a escravidão e o autoritarismo.

O Dia da Consciência Negra tem o intuito, também, de validar a existência das pessoas negras, discutir o racismo estrutural no Brasil, levantar debates a respeito de problemas que ainda perduram e reconhecer que muitas pessoas ainda hoje não têm acesso à própria ancestralidade devido à escravidão.

Além disso, a data busca relembrar os embates históricos que envolveram o período da escravidão, a postura da Princesa Isabel em relação à Lei Áurea, o tratamento que esses povos escravizados receberam depois disso e, claro, a forma como essa sequência de fatos se reflete até os dias atuais.

A data do Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, foi estabelecida como menção ao dia da morte de Zumbi, líder do maior quilombo do Brasil, Palmares, e um dos grandes nomes quando o assunto é o antiescravismo.

Zumbi foi morto no dia 20 de novembro de 1965, aos 40 anos de idade, por representantes do governo, tendo partes do seu corpo expostas ao público na cidade de Recife. O Dia da Consciência Negra foi celebrado no dia 20 de novembro pela primeira vez em 1971.

Anteriormente, a data era celebrada em 13 de maio, dia da publicação da Lei Áurea, mas, como é considerada uma falsa liberdade, já que não houve políticas sociais para amparar os negros recém-alforriados, a data foi revogada pelo MNU.

A partir da Constituição de 1988, o Movimento Negro começou a ser citado em algumas leis que visam estabelecer certo nível de reparação histórica e se opõem ao racismo e à desigualdade social sofrida especialmente por pessoas negras. Entre as leis aprovadas a respeito da população negra no Brasil, estão:

  • Lei nº 7.716/1989: definiu que racismo é crime;
  • Lei nº 10.639/2003: definiu a obrigatoriedade do ensino da história afrodescendente nas escolas brasileiras: “O conteúdo programático […] incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.”;
  • Lei nº 12.711/2012: estipulou as cotas raciais para pretos e pardos em processos seletivos de universidades e instituições federais.

Em 1988 também, o governo federal anunciou a criação da Fundação Palmares, feita para “promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira”.

Quem foi Zumbi dos Palmares?

Zumbi foi uma grande figura popular abolicionista. Não há muitos registros históricos a respeito de sua vida, mas é sabido que ele era o grande líder do quilombo dos Palmares, o maior quilombo do Brasil, tendo abrigado mais de 30 mil pessoas.

Muitos dos relatos sobre a atuação de Zumbi foram extraídos dos registros feitos pelos colonizadores portugueses, mas algumas informações mais profundas sobre a vida desta grande figura foram resgatadas pelo jornalista Décio de Freitas, que revelou que Zumbi havia sido sequestrado na infância e criado por um padre até os 15 anos de idade, quando fugiu, voltou para Palmares e defendeu o quilombo dos bandeirantes.

Essa história, no entanto, é questionada por muitos historiadores, já que o jornalista não divulgou os documentos aos quais afirma ter tido acesso para realizar o seu trabalho.

Os fatos realmente considerados legítimos sobre Zumbi, portanto, relatam que ele nasceu no quilombo dos Palmares e acabou se tornando representante entre os quilombolas, articulando movimentos de resistência contra os portugueses.

A biografia de Zumbi ainda está inacabada e sua imagem segue em construção até os dias de hoje. De qualquer forma, sua resistência é exaltada e tida como um símbolo que representa o movimento negro e abolicionista.

Importância do Dia da Consciência Negra

A data tem o principal objetivo de chamar à discussão o pertencimento das pessoas negras, suas culturas e a busca pela sua história, trazendo à tona uma necessária reflexão sobre os ainda existentes traços escravocratas na população brasileira, que se beneficia do racismo estrutural para sustentar poderes e manter à margem milhões de afro-brasileiros, vítimas constantes de racismo e outras violências.

Uma pauta importante sobre a data é, sem dúvidas, a discussão a respeito da abolição da escravatura e suas consequências, uma vez que, mesmo libertas, aquelas pessoas que foram escravizadas durante anos, não foram amparadas pelo Estado e não tinham noção do que poderiam fazer a partir de então, de onde morar ou como conseguir dinheiro para sustentar suas famílias.

Sem dados a respeito de suas origens, esses libertos agora estavam diante de um problema difícil de ser resolvido: a busca por emprego, moradia e respeito social. Destinados à margem da sociedade de uma forma ou de outra, os “ex-escravos” continuaram perseguidos, se não pelos capitães de mato, agora pela polícia.

O Dia da Consciência Negra busca justamente resgatar essa origem histórica do que hoje conhecemos como racismo estrutural, além de debater a situação carcerária da população negra, a falta de representatividade em campanhas culturais, os padrões que ainda se repetem em relação à empregabilidade e tantas outras questões sociais e históricas que precisam ser levantadas.

Alguns dados e fatos históricos que ajudam a entender como o racismo estrutural é um problema real no Brasil:

  • Em 2018, ano eleitoral, um levantamento mostrou que apenas 4% dos políticos eleitos para o Legislativo se autodeclararam negros, ou seja: somente 65 pessoas entre as 1.626 eleitas;
  • Ainda que 56% dos brasileiros se autodeclarem negros, apenas 17,8% da população está entre os mais ricos;
  • Entre as pessoas brasileiras mais pobres, os negros correspondem a 75%;
  • A maioria da população carcerária do país é composta por negros (65%);
  • Em relação à posse de drogas, os negros são mais condenados do que os brancos, ainda que sejam apreendidos com quantidades menores na maioria dos casos;
  • 76% das pessoas mortas por policiais são negras;
  • No mercado de trabalho, as pessoas negras recebem, em média, R$ 1.200 a menos em relação às pessoas brancas;
  • O racismo também está presente em algumas expressões e alguns termos bastante comuns, como “denegrir”, “mulato”, “cabelo ruim”,”morena”, “da cor do pecado”, “dia de branco”, “serviço de preto”, “não sou tuas negas”,  “a coisa tá preta”, “mercado negro”, “inveja branca”, “barriga suja” etc.
  • Religiões de origem africana são frequentemente alvos de preconceito e, nos anos de 1930, chegaram a ser proibidas no Brasil.

Dia da Consciência Negra é feriado?

A data célebre foi oficializada no calendário brasileiro por meio da lei nº 12.519, promulgada no dia 10 de novembro de 2011. A partir de então,  20 de novembro se tornou o dia oficial da Consciência Negra – em mais de mil municípios brasileiros, o dia é feriado, mas, como o feriado não foi obrigatório pela lei, em muitos outros municípios 20 de novembro é apenas um marco celebrativo, mas não considerado sueto.

Confira quais estados e municípios decretaram o Dia da Consciência Negra como feriado:

  • Alagoas: Todos os municípios, Lei Estadual Nº 5.724/95;
  • Amazonas: Todos os municípios, Lei nº 84/2010;
  • Amapá: Todos os municípios, Lei Estadual Nº 1169/2007;
  • Bahia: 3 municípios;
  • Espírito Santo: 2 municípios;
  • Goiás: 4 municípios;
  • Maranhão: 1 município (Pedreiras);
  • Minas Gerais: 11 municípios;
  • Mato Grosso do Sul: 1 município (Corumbá);
  • Mato Grosso: Todos os municípios, Lei Estadual Nº 7879/2002;
  • Paraná: 3 municípios;
  • Rio de Janeiro: Todos os municípios, Lei Estadual Nº 4007/2002;
  • Rio Grande do Sul: Todos os municípios – facultativo, Lei Estadual nº 8.352;
  • São Paulo: 102 municípios;
  • Tocantins: 1 município (Porto Nacional).

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